Na sede do Grupo Pão de Açúcar, na Av. Brigadeiro Luís Antônio, nº.3142, Abílio Diniz realizou um breve discurso durante a reunião do conselho administrativo da empresa. A assembleia geral extraordinária do grupo começou às 14h e terminou pouco antes das 15h. Na parte inicial, houve a leitura da ordem do dia e a renúncia de dois conselheiros da cota de Abilio, seus dois filhos, João Paulo e Ana Maria Diniz.
Em seguida, foram aprovados por unanimidade os nomes de três novos membros do conselho de administração, todos indicados pelo Casino – Roberto de Oliveira Lima, Eleazar de Carvalho Filho e Luiz Augusto de Castro Neves. A indicação dos executivos faz parte do processo de reestruturação no controle da companhia, previsto no Acordo de Acionistas assinado há seis anos por Abilio Diniz e Jean-Charles Naouri, presidente do Casino.
Depois disso, foi cedido tempo aos acionistas para que se pronunciassem, mas ninguém se manifestou. Abilio, então, fez um breve discurso em que agradeceu o carinho de amigos e colaboradores. Disse que estava bem e preparado para seguir adiante, ressaltou a importância da data, pois estava passando para frente o controle do grupo que fundou com seu pai, Valetim Diniz, quando terminou a faculdade na década de 40. “Estou sentido, mas aqui não é o lugar para pedir apoio, compreensão, amizade e amparo. Agora não é hora de desabafos. É um momento de transição, momento no qual é importante apontar rumos e reafirmar valores", disse.
O empresário também afirmou que em nenhum momento pensou em quebrar o contrato com o Casino. Em um retrospecto da trajetória do grupo, lembrou que desde a abertura de capital em 1995, o Pão de Açúcar aumentou seu valor de mercado em 30 vezes. Abílio também comentou que em 1999, quando se associou ao Casino, dizia-se que o grupo estava mal, mas tratava-se apenas de um problema de caixa. E que, a partir de então, compreendeu a importância do caixa e acredita que devido a essa nova postura, o grupo não teve muitas dificuldades durante a crise de 2008, conseguindo comprar o Ponto Frio e as Casas Bahia, em 2009.
No discurso, Abilio também mencionou a importância do endereço em que a assembleia acontecia. Foi nesse local que o pai do empresário fundou a confeitaria que deu origem à companhia e também onde sua filha, Ana Maria Diniz, nasceu. “Em muitos momentos escrevíamos ideias nas paredes”, disse.
Para o empresário, o sucesso empresarial atingido pelo grupo só foi possível porque "jogaram limpo e acreditaram no bem". Ele acredita que o novo acordo firmado com Casino em 2006 foi a coisa certa a se fazer, porque proporcionou liquidez às ações de seu pai, que pôde em vida distribuí-las a seus filhos. De acordo com Abilio, o acordo permitia que trabalhasse até quando quisesse no grupo, e ele afirma que continuará sendo o presidente do conselho para colaborar com o crescimento da companhia.
O Pão de Açúcar se associou ao Casino em 1999, mas só sete anos depois o grupo francês realizou um novo aporte na companhia e se tornando um dos principais acionistas. Na ocasião, foi criada a holding Wilkes, para Abilio Diniz e Casino controlarem de forma compartilhada o Pão de Açúcar. Agora, Abilio Diniz se tornará o segundo maior acionista do grupo e o presidente vitalício do conselho de administração do GPA. Ele pode permanecer nesse cargo enquanto estiver bem de saúde para desempenhar as funções da presidência.
Abilio ainda pediu que o Casino conservasse "a humanidade, a gentileza, o respeito e o cuidado" por todos os funcionários do Pão de Açúcar. E disse que as pessoas não deveriam encarar o evento como uma despedida, porque existem três coisas das quais não gosta: “cebola, despertador e despedidas”. Foi encerrada a sessão e Abílio foi aplaudido em pé pelos presentes (leia ao final o discurso na íntegra).
Os três novos conselheiros
Em um comunicado divulgado no website do Casino, no começo deste mês, a rede francesa destacava que Carvalho Filho é um executivo altamente qualificado e sócio-fundador da Virtus BR Partners. A nota acrescentava que ele já foi executivo-chefe do Unibanco Investment Bank e do UBS Brasil, além de ter passado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Já Castro Neves é descrito como diplomata com longa carreira no Ministério de Relações Exteriores. Ele foi embaixador do Brasil na China, entre 2004 e 2008, e também no Japão, de 2008 a 2010. Também foi presidente do conselho da Itaipu Binacional. Atualmente, é presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri). Roberto Lima já foi executivo-chefe da Vivo e da Credicard, além de ter passagens pela Accor e outros grupos. Atualmente é membro dos conselhos da Natura, Telefônica Brasil, Rodobens e Edenred.
Fim de uma era - Pela primeira em seis décadas, as vontades, a visão, as estratégias e os desejos de Abilio Diniz terão menos peso no Pão de Açúcar, o maior grupo varejista do País, a partir desta sexta. Por meio de um complexo acordo acionário com o grupo francês Casino, Diniz deixará de dar as cartas na empresa criada por seu pai ainda na década de 1940 e a qual dedicou toda sua vida adulta. A princípio, a partir das 14 horas desta sexta, quem manda prender e quem manda soltar no império que faturou quase R$ 20 bilhões no ano passado é um francês baixinho, de origem argelina e que atende pelo nome de Jean-Charles Naouri.
É ele quem, às nove horas da manha dessa sexta-feira, deve assumir a presidência do Conselho de Administração da Wilkes, a holding que, de fato, dá as cartas em todo o grupo Pão de Açúcar. Ela foi criada em 2005, quando o varejista francês Casino, do qual Naouri também é presidente do Conselho, pagou US$ 900 milhões a Abilio para comprar uma fatia ainda maior do grupo varejista brasileiro – o primeiro aporte havia sido feito em 1999. Pelo acordo assinado há sete anos, a partir desta sexta Abilio tem até dois meses para vender um lote de um milhão de ações da Wilkes para o Casino. Se resistir em fazê-lo, o Casino tem o direito de comprar uma única ação, pelo preço simbólico de R$ 1,00 e, assim, se tornar o controlador da holding.
Com a nova configuração, Abilio até permanece na presidência do Conselho de Administração da Companhia Brasileira de Distribuição, a empresa que controla todos os negócios do grupo, desde os supermercados Pão de Açúcar até as operações na internet no Ponto Frio, por exemplo. Mas a composição desse Conselho muda radicalmente. Até esta quinta, Abilio tinha cinco assentos, ocupados por ele, seus três filhos e sua esposa, Geyze Marchesi Diniz. Outros cinco postos eram ocupados por integrantes do Casino, além de quatro conselheiros independentes.
Agora, Abilio terá direito a ter apenas três assentos no Conselho, enquanto o Casino passará para oito, com um conselheiro a mais do que existe hoje. No futuro, o Casino pode indicar ainda mais três e chegar a 11 conselheiros ou 18 no total. Quatro integrantes continuarão independentes, mas mesmo que decidam unir-se a Abilio, os Diniz sempre estarão em desvantagem. Como Naouri mal lhe dirige a palavra desde que, na visão do empresário francês, tentou evitar o que deve acontecer nesta sexta arquitetando uma fusão com o Carrefour – um dos principais competidores do Casino na França –, a tendência é que Abilio Diniz se transforme em um de seus maiores pesadelos: uma rainha da Inglaterra. Terá a pompa, como presidente do Conselho, mas não terá o poder. Para Abilio, no entanto, a união com o Carrefour era mais um movimento no sentido de continuar expandindo as operações do grupo.
De todo modo, será uma nova fase em sua vida e ninguém – talvez nem ele – sabe ao certo quais serão seus próximos passos. Há vários caminhos que podem ser seguidos. Sua participação no grupo – de cerca de pouco mais de 20% das ações – pode lhe render mais de R$ 2 bilhões se vendidas. Há quem diga que ele tentará negociar uma saída em direção a uma das controladas do Grupo, como a Via Varejo, junto ao Casino. Ele pode, até mesmo, continuar como presidente do Conselho de Administração de forma vitalícia. Esta última, a menos provável, levando em conta a história desse que é um dos mais controversos e agressivos empresários brasileiros da segunda metade do século 20.
Para transformar o Pão de Açúcar no gigante que faturou mais de R$ 56 bilhões no ano passado, Abilio Diniz não mediu esforços. Quando jovem, abandonou o sonho de uma carreira acadêmica nos Estados Unidos para abrir, com o pai, o primeiro supermercado da família, no fim dos anos 50. Nos anos 80, comprou briga com o governo José Sarney - foi acusado de conspirar contra o Plano Cruzado ao estocar quase 4 milhões de latas de óleo no auge do desabastecimento – e, como ele mesmo diz, tornou-se o “inimigo número um do Brasil". Para assumir as rédeas do grupo, que por pouco não foi à bancarrota no início dos anos 90, entrou em uma disputa fraticida com os irmãos pelo controle da empresa. Por conta dessa briga, que o tornou o dono de fato da empresa, ficou anos sem trocar palavras com a mãe.
“A tarde da briga em que se selou o rompimento da família foi um dos meus piores momentos. Aquilo me fez questionar seriamente algumas das atitudes que tomei ao longo da vida: havia trabalhado duro para construir o Pão de Açúcar. Nunca parei para pensar na fragilidade de minha situação dentro da empresa", escreveu ele em seu livro "Caminhos e Escolhas – O Equilíbrio para uma Vida mais Feliz", misto de biografia e auto-ajuda que lançou em 2004, um ano antes de selar seu destino com o Casino.
Figura polêmica na década de 80, quando conseguiu que um de seus mais próximos colaboradores, Luiz Carlos Bresser-Pereira, se tornasse o substituto de Dilson Funaro – a quem tanto criticara – no Ministério da Fazenda, Abilio encerrou aquela década com um trauma. Foi sequestrado, às vésperas das primeiras eleições presidenciais diretas desde o Golpe Militar de 1964, por um grupo de guerrilheiros. Seus algozes, ao serem capturados, foram vestidos com camisas do PT e de apoio a Lula, que disputava a Presidência com Fernando Collor de Mello.
A partir dessa experiência Abílio passou por uma transformação profunda. De empresário com imagem de ganancioso passou a cultivar outra, a de um empreendedor inovador, um líder focado em resultados e um absoluto obcecado pela forma física. Em pouco mais de 10 anos, tirou o Pão de Açúcar de uma situação pré-falimentar para a liderança inconteste do varejo brasileiro, título conquistado em 2001, dois anos após o início da parceria com o Casino. Ganhou, assim, uma vaga no panteão dos maiores empresários da história do país.
Ao longo da última década expandiu de forma vigorosa o negócio criado por seu pai. Viu o valor de mercado da companhia sair dos R$ 5,5 bilhões para mais de R$ 23 bilhões – valor atingido em maio desse ano. Hoje são quase 150 mil empregados espalhados pelo País. Mas, ao cabo desse impressionante crescimento, acabou perdendo o controle sobre o império que criou. Ninguém ousa arriscar qual será o próximo passo de Abilio. Mas ao menos em um ponto não há divergência: não há quem acredite que ele ficará parado.
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