quinta-feira, 9 de novembro de 2023

Adoção tardia: um caminho para a construção de famílias, que vai além dos laços biológicos


A adoção de crianças e adolescentes é um ato de amor e coragem que não apenas muda vidas, mas também constrói famílias. No Brasil, de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 30 mil crianças e adolescentes encontram-se abrigados pelo Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), mas apenas 4 mil deles estão aptos para adoção. Do outro lado da história, 35 mil famílias estão inscritas no SNA. A proporção parece favorável, no entanto, a matemática não fecha, uma vez que, segundo o próprio CNJ, a maioria dos pretendentes desejam adotar crianças de até 4 anos de idade. Essa preferência torna a adoção tardia o principal desafio a ser enfrentado.

Em todo o país, 1.453 adolescentes que aguardam adoção estão na faixa etária de 14 anos a mais de 16 anos. Enquanto isso, das quase 35 mil famílias habilitadas, apenas 93 delas aceitam adotar crianças e adolescentes nessa faixa etária, o que equivale a apenas 0,27%. Pernambuco está entre os estados que possuem números acima da média nacional, mas ainda distante do ideal. Dos 850 pretendentes pernambucanos inscritos no SNA, 23 aceitam adotar jovens nessa faixa etária, o que corresponde a 2,7%.

De acordo com a pesquisa do SNA, mais de 63% (21.476) das famílias brasileiras habilitadas no sistema desejam adotar crianças de até, no máximo, seis anos de idade. Há três anos, a advogada e influenciadora digital Romina Duque Porto decidiu seguir na contramão das estatísticas. A adoção do pequeno João Gustavo (10), na época com 7 anos de idade, concretizou um sonho que começou a se formar cinco anos antes. Durante esse período, Romina, que havia decidido ser mãe solteira, passou por três fertilizações in vitro, e a cada tentativa frustrada, a alternativa da adoção ganhava força. Sem perceber, a maternidade começou a crescer em seu coração, e ela não imaginava que para esse amor florescer bastaria apenas um pequeno detalhe: o encontro com João Gustavo.

No cadastro de adoção, Romina se habilitou para adotar uma criança na faixa etária de 3 a 7 anos, sem preferência por sexo ou cor. Em junho de 2020, o momento tão esperado aconteceu. Um vídeo que mostra esse encontro viralizou nas redes sociais, emocionando milhares de internautas em todo o mundo e motivando famílias a optarem pela adoção tardia. "Recebi a notícia da chegada de Gu e o aceitei sem ver foto, características físicas ou qualquer outra referência. Apenas o quis", relata.

Ainda segundo ela, ao ver a foto do filho, foi amor à primeira vista. “Quando recebi a foto no final do dia, vi que ele era exatamente o que sempre desejei. Costumo dizer que o que aconteceu conosco foi uma rara conexão. Adoções tardias não costumam ser tão intensas quando a criança encontra a família. A partir daí, nossa ligação se tornou mais sólida. Tão sólida que, em poucos meses juntos, já tínhamos características físicas semelhantes, e as pessoas ficavam impressionadas quando falávamos que estávamos juntos apenas há meses”, lembra.

Hoje, três anos após o término do processo de adoção, a advogada destaca como a maternidade mudou sua vida. “Já não sou mais a mesma que o abraçou no dia em que ele nasceu para mim. É como se eu tivesse me encontrado. Encontrei meu propósito de vida ao ser mãe dele e também ao ser cuidada por ele. Frequentemente esqueço que Gu chegou pela via da adoção e me refiro à sua chegada como 'quando Gustavo nasceu'. Isso nem é proposital. Ele é minha força. É a paz que encontro no meio do tumulto diário. Somos cúmplices, parceiros. E sim, eu faria tudo de novo, se necessário, para encontrá-lo. Porque agora vejo o tamanho do vazio que tinha antes de a maternidade adotiva me encontrar”, completa.

*Adoção em 2022* - Em 2022, das 4.203 adoções realizadas no Brasil, 156 ocorreram em Pernambuco, de acordo com dados do SNA. O processo de adoção é totalmente gratuito, não requer a participação de um advogado e começa com um pré-cadastro que deve ser feito no site do SNA.

Em seguida, o pretendente deve solicitar a habilitação na Vara da Infância e Juventude ou Juízo Cível competente para adoção no município onde reside, onde serão cumpridas todas as etapas da habilitação dos candidatos a pais e mães. É importante destacar que a idade mínima para se habilitar à adoção é 18 anos, independentemente do estado civil, desde que seja respeitada a diferença de 16 anos entre quem deseja adotar e a criança a ser acolhida.

O requerimento de inscrição para adoção deve ser preenchido com dados pessoais e familiares e acompanhado dos seguintes documentos: cópia autenticada da certidão de nascimento, casamento ou declaração relativa à união estável; cópia da carteira de identidade e do CPF; comprovante de renda e de domicílio; atestados de sanidade física e mental; certidão de antecedentes criminais; e certidão negativa de distribuição cível, conforme exige o art. 197 A do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Posteriormente, a pessoa interessada em adotar crianças e/ou adolescentes inicia a participação em cursos e programas de preparação sobre os aspectos jurídicos, sociais e psicológicos da adoção, bem como se envolve em reuniões com os Grupos de Apoio à Adoção, que podem ser realizadas presencialmente ou à distância. A partir desse momento, começa o processo de habilitação dos pretendentes. Na unidade judiciária, o juiz, diante de toda a documentação necessária para a habilitação à adoção, profere um despacho inicial, abrindo vistas ao Ministério Público para considerações sobre o processo. Em seguida, o magistrado encaminha a ação de adoção para que sejam realizados estudos psicossociais pela equipe interprofissional da unidade judiciária.

Concluídas as fases, o juiz decidirá sobre os requerimentos do Ministério Público, inclusive sobre a eventual necessidade de audiência, e, após essa, será proferida a sentença. O juízo tem o prazo de 120 dias para proferir a sentença no processo. Se necessário, o prazo pode ser prorrogado por mais 120 dias. Caso o pedido de adoção seja favorável, após o trânsito em julgado, os pretendentes a pais/mães serão incluídos no Cadastro Nacional de Adoção (CNA) do CNJ e aguardam a convocação para realizar a adoção.

Após a convocação para adotar, o pretendente inicia o período de estágio de convivência com a criança ou adolescente e recebe visitas sistemáticas da equipe da comarca de domicílio do adotante. Após o estágio de convivência, o juiz da comarca de origem da criança a ser adotada profere a sentença deferindo ou não a adoção. A recusa sistemática na adoção das crianças e adolescentes indicadas levará à reavaliação da habilitação concedida.