Sociedade do Cansaço e NR-1: A Nova Lei Contra a Pressão por Performance
*Por Mariângela Borba.
Olá, leitor do #SendoProsperidade, tudo bem?
Nesta semana, vamos falar sobre saúde mental — não só porque, a partir de 2026, ela deixa de ser apenas uma pauta importante para se tornar exigência legal dentro das empresas, mas também porque terminei recentemente a leitura do livro Sociedade do Cansaço (The Burnout Society), do filósofo sul-coreano-alemão Byung-Chul Han, um dos mais lidos da atualidade. Achei essencial trazer essa reflexão para cá.
E o que Han defende?
O descanso, o silêncio, a contemplação.
Exatamente o oposto do discurso dominante de alta performance. E é nesse contexto que surge a atualização da NR-1, norma que trata do Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO), que agora inclui formalmente os riscos psicossociais — como estresse, assédio, fadiga, sobrecarga mental e emocional. A mudança reflete a crescente preocupação com a saúde mental dos trabalhadores e o aumento das doenças relacionadas ao trabalho no Brasil.
Em outras palavras: todas as organizações, de qualquer porte, terão que mapear, avaliar e controlar fatores que afetem a saúde emocional de seus colaboradores, e não apenas os riscos físicos. Quem não se adequar corre risco de enfrentar multas, ações trabalhistas e afastamentos.
É preciso agir antes do prazo.
No livro, Han afirma:
“A sociedade do desempenho não é uma sociedade livre. Ela produz novas coerções.”
E não é exatamente assim que vivemos? Acreditamos correr por liberdade, mas estamos cada vez mais presos.
Han não fala só sobre produtividade — fala sobre humanidade. Segundo ele, o cansaço crônico, a ansiedade e o vazio que muitos sentem são sintomas de uma sociedade doente, que cobra demais e cuida de menos.
A tecnologia, que prometeu tempo livre, entregou apenas mais trabalho.
Hoje respondemos 300 e-mails por dia. As tarefas ficaram mais rápidas, mas, em compensação, dobraram. Essa é a armadilha da eficiência: tudo melhora… e tudo sobrecarrega.
E há algo mais:
O ser humano é o único capaz de destruir o próprio ambiente.
Nenhum animal faz guerra contra seu lar. Essa inversão aparece em tudo: no vício da exposição, na obsessão por produtividade, no medo de parar. Confundimos liberdade com desempenho — e nos tornamos escravos da pressa.
Cada ferramenta que acelera o trabalho também multiplica as expectativas sobre ele.
Mais produtividade gera metas maiores, e metas maiores exigem mais produtividade.
O resultado? Nenhuma folga — apenas trabalho comprimido no mesmo dia.
Antigamente, uma carta levava semanas para ir e voltar. Logo, ninguém cobrava rapidez.
Hoje, dez minutos sem resposta no WhatsApp já soa como descaso. Velocidade virou padrão; lentidão virou incompetência — mesmo que a pressa continue sendo a inimiga da perfeição.
A aceleração foi tanta que perdemos a capacidade de ir devagar.
Lembra do filme Tempos Modernos, de Chaplin?
Aquele operário que, condicionado pela máquina, saia apertando tudo o que via pela frente — até os botões da saia de uma moça?
É isso. Com a tecnologia, a mente opera no mesmo modo automático.
Pessoas não conseguem mais ler sem pular parágrafos, assistir vídeos sem acelerar, ouvir áudios sem adiantar.
Conversas longas parecem tortuosas.
O cérebro, treinado para ser rápido, deixou de processar profundamente.
E isso gera um fenômeno perigoso:
Urgência virou sinônimo de importância.
O urgente grita; o importante espera — e muitos terminam o ano tendo resolvido milhares de urgências alheias e nenhuma necessidade própria.
A tecnologia prometeu liberdade, mas nos aprisionou na pressa.
Viver virou correr.
Resultado: estamos sempre devendo, sempre atrasados, sempre com a sensação de que falta algo.
A aceleração não reduz demandas — aumenta expectativas.
E o efeito coletivo é nítido: uma população adoecida.
Rapidez virou virtude, quando, na verdade, rapidez sem direção é só agitação.
Você pode fazer cem coisas por dia e não construir nada.
O que realmente vale a pena exige tempo e profundidade — exige lentidão.
É por isso que Han propõe outra direção: silêncio, pausa, rituais de contemplação.
Ele mesmo vive assim: evita telas, cultiva rosas, toca Bach no piano, é católico e faz orações diárias em seu jardim, que chama de “mosteiro secreto”. Não por acaso, em 2025, ele recebeu o Prêmio Princesa das Astúrias de Comunicação e Humanidades por suas reflexões sobre digitalização e desumanização.
Comunicadora e Jornalista Diplomada, com sólida experiência como Revisora Credenciada e Social Media Expert, Mariângela Borba é também Produtora Cultural com reconhecida expertise em Cultura Pernambucana, tendo atuado em conselhos culturais e em órgãos públicos como a Secretaria Executiva do MinC (Regional Nordeste) e a Secretaria de Imprensa de Paulista (PE). Atualmente, transita pelos estudos da Psicanálise, o que adiciona uma camada analítica à sua prática profissional. É membro da UBE e da AIP, honrando um legado familiar na fundação desta última.