Recife, Pernambuco – O palco do Teatro Santa Isabel, e de outros espaços culturais do Recife, foi testemunha de uma rica e complexa evolução do teatro pernambucano ao longo do século XX. Artistas itinerantes, muitos deles com histórias de vida marcadas por fugas familiares para seguir a paixão pelas artes, foram fundamentais para a efervescência cultural da época.
Os anos 1920 representaram um marco para o amadorismo teatral. A montagem de "Beliche" em 1926 no Santa Isabel é um exemplo notável, com mais de 100 amadores no elenco, alcançando grande sucesso. Nesse período, duas companhias de teatro de revista, a Barra Clan e a Bolacha, causaram um "susto danado" no Recife. Pela primeira vez, a nudez feminina, ainda que não explícita, começou a aparecer nos palcos com figurinos reduzidos, gerando polêmica, embora essas companhias se apresentassem no Teatro do Parque, e não no Santa Isabel.
A década de 1930 trouxe consigo uma renovação com a popularização das comédias de costumes. No Santa Isabel, surge uma figura central: Odete Garrido, uma atriz cômica de grande talento. Mas o verdadeiro divisor de águas foi a estreia do Grupo Gente Nossa em 2 de agosto de 1931. Este foi o primeiro grupo de teatro profissional do Recife, com uma trajetória que se estendeu até 1942, sob a liderança de Samuel Campelo.
Campelo, cuja importância é tanta que tem até uma estátua em sua homenagem, foi o primeiro homem de teatro a administrar o Santa Isabel. Antes dele, a gestão da casa era feita por militares, professores ou músicos. Com Samuel no comando, o teatro floresceu, atraindo companhias e artistas renomados como Procópio Ferreira, Cacilda Becker e Ziembinski. O Grupo Gente Nossa, por sua vez, operava com uma rotina intensa de apresentações de terça a domingo, incluindo peças infantis nas manhãs de domingo, demonstrando uma dedicação e profissionalismo ímpares para a época.
A Era de Valdemar de Oliveira e o Legado do Teatro para Crianças
A figura de Valdemar de Oliveira surge como um pupilo de Samuel Campelo, assumindo a direção artística do Grupo Gente Nossa. Após a morte de Samuel em 1939, Valdemar liderou o grupo, obtendo financiamento do governo federal e realizando montagens grandiosas, como uma "Paixão de Cristo" anterior à de Nova Jerusalém, com centenas de artistas e música ao vivo.
Apesar do sucesso com o Grupo Gente Nossa, Valdemar de Oliveira nutria uma preocupação com o profissionalismo do teatro. Isso o levou a criar dois núcleos fundamentais:
* Teatro para Crianças (a partir de 1939): Um marco para a cena infantil, com peças escritas para crianças, encenadas por crianças e com dramaturgia específica para esse público, sem as amarras da censura. Há um livro publicado sobre essa iniciativa.
* Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP): Um núcleo paralelo ao Grupo Gente Nossa, que construiu uma carreira extremamente vitoriosa.