quinta-feira, 12 de junho de 2025

Vik Muniz: Uma Jornada de Quase Quatro Décadas transformada em uma Aula de Arte

Em sua exposição "A Olho Nu", Vik Muniz convidou os jornalistas presentes a uma imersão em quase quatro décadas de sua produção artística, revelando uma trajetória marcada pela experimentação e pela constante reflexão sobre a natureza da imagem e sua relação com o mundo físico. A mostra, com curadoria de Daniel, não segue uma ordem cronológica, propositalmente criando uma "bagunça" que estimula o visitante a reavaliar suas próprias percepções.


Olho Nu: Uma Dupla Conexão com o Artista

O nome "Olho Nu" carrega um duplo significado para o artista. Em primeiro lugar, é um reconhecimento da dimensão pessoal da exposição, que expõe tanto os acertos quanto os erros de uma carreira extensa. É um convite à vulnerabilidade e à abertura, mostrando a arte como ela é, sem adornos. Em segundo lugar, o título remete a uma atitude de desordem e desconstrução, refletindo a curadoria não linear e a diversidade de materiais e técnicas presentes nas obras.


Da Imagem Impressa à Era Digital: Uma Transição Testemunhada

Muniz se coloca como um testemunho da transição da imagem que dependia de um suporte físico para a imagem etérea e digital. Para ele, a imagem impressa possui um valor intrínseco, sendo um elo entre o mundo tangível e as emoções e memórias que ela evoca. Essa dualidade entre o físico e o imagético é uma tensão constante em sua obra e é o cerne de sua investigação sobre a arte na era digital.


O Vocabulário de Materiais Simples e o Humor como Ferramenta

A vasta gama de materiais utilizados por Muniz – de lixo a diamantes, de caviar a macarrão, de papel a fotografias de família – serve para desmistificar a relação entre o espectador e o artista. Ao empregar elementos cotidianos e acessíveis, ele convida o público a uma nova leitura de imagens que talvez já sejam familiares, incentivando uma "calibragem" da experiência visual. O humor também é uma ferramenta fundamental em sua prática, utilizada não para ser engraçado, mas para "desarmar" o espectador, permitindo que ele reflita sobre conceitos complexos enquanto se diverte.



Arte como Interface entre Mente e Matéria

Para Muniz, a arte é o "desenvolvimento da interface entre a mente e a matéria, entre a consciência e o fenômeno". Essa definição, que ele considera simples, abrange também a religião e a ciência, pois todas as formas de existência giram em torno de como nos relacionamos com o outro e com as coisas. A estranheza e o alumbramento (termo regional de Recife que significa um misto de espanto e admiração) são sentimentos essenciais na experiência artística, pois provocam o repensar e a reavaliação da nossa relação com o objeto.



A Obra de Arte: Ponte e Ferramenta

Muniz argumenta que a obra de arte não funciona apenas como uma "coisa", mas como uma ponte entre coisas, sendo ao mesmo tempo objeto e ferramenta. Nesse sentido, a fotografia impressa se destaca como a ferramenta ideal, pois possui características de ambos os mundos: é um objeto físico que pode ser segurado e, ao mesmo tempo, transmite emoções e memórias do mundo interior.

O Desafio da Imagem Autônoma e a Lição da Fotografia

A autonomia da imagem digital, que se desvinculou da condição física e do compromisso de registrar a realidade, é um tema que perturba o artista. No entanto, ele vê essa transformação como uma nova oportunidade, semelhante ao que ocorreu com a pintura após a invenção da fotografia. A fotografia "libertou a pintura do compromisso com a realidade", permitindo que os pintores explorassem a meta-linguagem da arte e a relação do indivíduo com o mundo visual. Muniz acredita que o momento atual exige discernimento e experimentação para compreendermos essa nova relação com a imagem.



Da Escultura à Fotografia: O Gênese de um Processo Criativo

Vik Muniz iniciou sua trajetória como escultor, preocupado em fazer coisas físicas. Ele revela que a ideia de fotografar suas obras surgiu quando percebeu que as fotografias perfeitas tiradas por um fotógrafo profissional não capturavam a imagem original que existia em sua mente. Ao fotografar suas próprias esculturas de um jeito "ruim, mas certo", ele conseguiu fechar o círculo da criação, trazendo a ideia inicial para o mundo físico através da fotografia. Essa percepção o levou a criar objetos especificamente para serem fotografados, sendo um milagre que muitos deles ainda existam. Essa relação entre a criação do objeto e a fotografia, e os círculos que se fecham nesse processo, são uma temática recorrente na exposição.