quinta-feira, 19 de junho de 2025

#EntrevistasInéditas Publius: A Trajetória Mutante de um Artista Enraizado em Pernambuco


Recife, Pernambuco – Em meio à efervescente cena musical pernambucana, o multi-instrumentista e compositor Publius se destaca por sua sonoridade plural e a constante busca por novas experimentações. Em entrevista, o artista, que se autodefine como "mutante", mergulha nos processos criativos de sua carreira, revelando as influências, desafios e os próximos passos que prometem continuar transformando o cenário musical.

Das Raízes Udgrúdis à Liberdade de Rótulos

O primeiro álbum de Publius, "solo", lançado em 2013, marca o início dessa jornada autoral. "Foi inspirado no udigrúdi recifense dos anos 1970, somando a isso as influências da música pop de Minas Gerais, além do rock progressivo da banda inglesa Pink Floyd", revela Publius sobre o processo, que ele descreve como uma "colagem" de edições e colaborações no Malunguim Studio, com Christiano Lemgruber e Pierre Leite. O disco contou com participações de talentos como Areia, Laila Rosa, Lara Klaus, Mateus Alves, Tomás Alves, Tomás Melo e Breno Lira.

A motivação para transitar entre rock progressivo, psicodelia e MPB, segundo o artista, veio do desejo de fugir de rótulos. "Eu quis sair da 'zona de conforto' de tocar música nordestina usando apenas a timbragem acústica", explica, citando a pejorativa alcunha de "forrozeiro" que, por vezes, lhe era atribuída devido a projetos anteriores como Rabecado e Azabumba. "Quis mostrar que posso soar tanto 'experimental' ou 'tropicalista' quanto 'forrozeiro'. Posso fazer a música com o rótulo que eu quiser. Ou não ter rótulos para a minha música. Sou um artista 'mutante'. Mudar é sempre desafiador. Movimento é sempre bom para o corpo e para a mente", enfatiza.

"Dia de Sol": Um Marco de Colaborações e Amadurecimento

O álbum "Dia de Sol", de 2016, representa um novo momento na carreira de Publius, já com uma banda consolidada para acompanhá-lo. "O processo criativo foi, portanto, completamente diferente do 'solo'", afirma. O disco é valorizado pelos arranjos, timbres e sonoridades gravadas, além das "participações muito especiais de artistas que admiro como Jam da Silva, Lula Queiroga e Marcelo Jeneci. Uma alegria imensa para mim", compartilha.

A Várzea como Berço de Inspiração

A forte conexão com suas raízes é evidente na canção "Várzea", uma homenagem ao bairro onde nasceu. "A Várzea é minha fonte de inspiração. Meu berço. Meu umbigo. Onde começou o meu universo. Minha relação com a Natureza e com a Música", declara. Publius ressalta a influência de sua terra natal em sua arte: "Pernambuco é berço de criatividade, de resistência e de vanguardismo nas artes."

Parcerias Inesquecíveis e a Cena Pernambucana

Ao longo de sua trajetória, Publius acumulou uma série de colaborações notáveis. "Com certeza, poder colaborar com artistas populares como a Dona Cila do Coco e Mestre Salustiano não teve preço. Artistas 'essência'", pontua. Entre as mais marcantes, ele destaca a parceria "inusitada" com o japonês Morio Agata e Silvério Pessoa na gravação do clássico "Asa Branca" no álbum "Taruphology" (2007). A alegria se estende à gravação de "Vão", composição em parceria com Juliano Holanda, pelo Mestre Ferrugem, e outras colaborações com nomes como Tonino Arcoverde, Geraldo Maia, Lulu Araújo, Joaquim Izidro, Gonzaga Leal e Alessandra Leão.

Questionado sobre a cena musical pernambucana, Publius é categórico: "Sim. Pernambuco é celeiro cultural. Sempre foi vanguarda." Como exemplo recente, ele cita sua participação no disco "Quimera" (2025) da nova cantora e compositora pernambucana Lua, tocando bandolim na música "Samba Verde".

Da Pandemia à Renovação Constante

A contemplação pela Lei Aldir Blanc durante a pandemia foi "excelente e desafiador" para o artista. "A pandemia deixou ausências e marcas profundas. Mas, mesmo assim, fizemos um trabalho belo e consistente, cheio de participações especiais como a de Martins, Rachel Bourbon, Hugo Linns, Juliano Holanda e Mozart Ramos", relembra.

Sobre o processo de composição, Publius revela que "cada canção tem sua própria história. Seu próprio processo criativo. Tudo que vivo e sinto me inspira. Um livro, uma leitura, um filme... Às vezes, a partir da leitura de um poema nasce uma música... Outras vezes, vem música antes e depois o texto e, outras vezes, música e letra vêm juntas. Não existe, assim sendo, uma 'fórmula' de como fazer canções".

Desafios da Independência e o Futuro

Manter-se independente na indústria musical é um desafio, especialmente com a precarização das profissões impulsionada pelos avanços tecnológicos. No entanto, Publius mantém o otimismo: "Mas, se mantivermos o foco e soubermos aproveitar as oportunidades de trabalho que surgirem, nós conseguimos driblar os obstáculos e seguir re-existindo. Sempre nos renovando. E transformando o mundo ao nosso redor, assim espero! Faço arte para mudar o mundo. Tentar criar um lugar mais acolhedor para todas as pessoas, como a Natureza nos ensina."

Para os próximos anos, Publius promete "novos sons, novos sonhos! Sonhos sempre inquietos! Sempre procurando fazer sentido! Ser asa e ser raiz!". O artista adianta que está compondo uma trilha sonora inédita para uma peça teatral e que virão "novas canções, novos discos com o Rabecado, além de novos discos do meu projeto solo." A certeza é que a jornada "mutante" de Publius continuará a enriquecer a música pernambucana com sua autenticidade e inovação.


Que tal saber mais sobre esse artista pernambucano?

1️⃣ Como foi o processo de criação do seu primeiro álbum, "Solo"? Quais influências mais te marcaram?  
O meu primeiro disco “Solo” foi lançado em 2013. O álbum “Solo” foi inspirado no udigrúdi recifense dos anos 1970 somando a isso as influências da música pop de Minas Gerais, além do rock progressivo da banda inglesa Pink Floyd. Eu sempre quis vestir as minhas canções com arranjos mais “psicodélicos” e queria experimentar novos timbres. O disco foi quase uma “colagem”. Como não tínhamos arranjos prontos, foi um disco cheio de edições e foi criado no MalunguimStudio por mim, por Christiano Lemgruber e por Pierre Leite. Inúmeras participações especiais estão no disco como o talentoso Areia, as queridas Laila Rosa e Lara Klaus, Mateus Alves, Tomás Alves, Tomás Melo, Breno Lira, entre outros. Adoro ouvir o disco até hoje. Curto no “solo”, sobretudo, canções como “o tempo” e “das flores escuras”. 

2️⃣ O que te motivou a misturar rock progressivo, psicodelia e MPB na sua sonoridade?  
Eu quis sair da “zona de conforto” de tocar música nordestina usando apenas a timbragem acústica. Estava cansado de receber de parte da imprensa pernambucana um pejorativo rótulo de “forrozeiro”, por causa da minha participação em projetos como o Rabecado (com dois discos lançados em 2007 e 2010, além de um DVD em 2011) e o da banda Azabumba (disco lançado em 2005). Quis, portanto, experimentar timbres diferentes e criar uma música mais “eletrônica”, na época. Quis mostrar que posso soar tanto “experimental”ou “tropicalista” quanto “forrozeiro”. Posso fazer a música com o rótulo que eu quiser. Ou não ter rótulos para a minha música. Sou um artista “mutante”. Mudar é sempre desafiador. Movimento é sempre bom para o corpo e para a mente.

3️⃣ Seu álbum "Dia de Sol" tem uma forte relação com a sua história. O que esse disco representa para você?  
“Dia de sol” foi criado em 2016 quando eu já tinha uma banda para me acompanhar na estrada. O processo criativo foi, portanto, completamente diferente do “solo”. Ele representa muito para mim pelos arranjos, timbres, sonoridades que gravamos, além de ter participações muito especiais de artistas que admiro como Jam da Silva, Lula Queiroga e Marcelo Jeneci. Uma alegria imensa para mim. 

4️⃣ "Várzea" é uma homenagem ao bairro onde você nasceu. Como o Recife e Pernambuco influenciam sua música?  
A Várzea é minha fonte de inspiração. Meu berço. Meu umbigo. Onde começou o meu universo. Minha relação com a Natureza e com a Música. Pernambuco é berço de criatividade, de resistência e de vanguardismo nas artes. 

5️⃣ Você já colaborou com grandes nomes da cena pernambucana. Qual parceria foi mais marcante para sua carreira?
Com certeza, poder colaborar com artistas populares como a Dona Cila do Coco e Mestre Salustiano não teve preço. Artistas “essência”. 
Talvez, a mais marcante e inusitada tenha sido a parceria com o japonês Morio Agata. Gravei bandolim no clássico nordestino “asa branca” com Morio Agata e Silvério Pessoa no álbum Taruphology (2007). 
Outra grande alegria foi o Mestre Ferrugem ter gravado a composição “vão”, música feita em parceria com Juliano Holanda. Tonino Arcoverde, Geraldo Maia, Lulu Araújo, Joaquim Izidro, Gonzaga Leal, Alessandra Leão… A lista é grande.
  
6️⃣ Como foi ser contemplado pela Lei Aldir Blanc e levar sua música para novos públicos durante a pandemia?  
Foi excelente e desafiador. A pandemia deixou ausências e marcas profundas. Mas, mesmo assim, fizemos um trabalho belo e consistente, cheio de participações especiais como a de Martins, Rachel Bourbon, Hugo Linns, Juliano Holanda e Mozart Ramos. 

7️⃣ Você acredita que a cena musical de Pernambuco continua sendo um grande celeiro de inovação artística?  
Sim. Pernambuco é celeiro cultural. Sempre foi vanguarda. Para citar um exemplo… Recentemente, participei do disco de Lua, uma nova cantora e compositora pernambucana. Participei tocando bandolim na música “samba verde” no seu mais recente disco “quimera”(2025).

8️⃣ O que te inspira na composição de letras e melodias? Como nascem suas músicas?  
Cada canção tem sua própria história. Seu próprio processo criativo. Tudo que vivo e sinto me inspira. Um livro, uma leitura, um filme… As vezes, a partir da leitura de um poema nasce uma música… Outras vezes, vem música antes e depois o texto e, outras vezes, música e letra vêm juntas. Não existe, assim sendo, uma “fórmula” de como fazer canções. 

9️⃣ Quais são os desafios de se manter independente na indústria musical hoje?  
A precarização das profissões é um grande desafio que estamos enfrentando por causa dos avanços tecnológicos. Uma contradição, não é mesmo? Mas, se mantivermos o foco e soubermos aproveitar as oportunidades de trabalho que surgirem, nós conseguimos driblar os obstáculos e seguir re-existindo. 
Sempre nos renovando. E transformando o mundo ao nosso redor, assim espero! Faço arte para mudar o mundo. Tentar criar um lugar mais acolhedor para todas as pessoas, como a Natureza nos ensina.

🔟 O que podemos esperar de Publius para os próximos anos? 
Novos sons, novos sonhos! Sonhos sempre inquietos! Sempre procurando fazer sentido! Ser asa e ser raiz! Estou compondo uma trilha sonora inédita para uma peça teatral e prometo novas canções, novos discos com o Rabecado, além de novos discos do meu projeto solo.

Fotos: Ignacio Cerezzo