Podcast Taís Paranhos

terça-feira, 15 de maio de 2018

Ministério Público notifica Globo por (falta de) representação racial em Segundo Sol

A novela Segundo Sol já está dando muito o que falar. Desde a divulgação do primeiro teaser da novela das 9, em abril, a trama causou revolta nas redes por ser ambientada em Salvador, cidade com a maior população negra fora da África, e, mesmo assim, ter pouquíssimos atores negros no elenco.

A Globo emitiu um comunicado em que admite que “temos uma representatividade menor do que gostaríamos e vamos trabalhar para evoluir com essa questão”, mas, aparentemente, só o comunicado não foi suficiente e o Ministério Público do Trabalho (MPT) resolveu intervir.

De acordo com a Revista Veja, o MPT, por meio da Coordenadoria Nacional de Promoção de Igualdade de Oportunidade e Eliminação da Discriminação no Trabalho (Coordigualdade), enviou uma notificação recomendatória para que a emissora “respeite a diversidade racial” da cidade retratada na novela.

Na notificação, o Ministério pede que sejam feitas “adequações necessárias no roteiro e produção a fim de assegurar a participação de atores e atrizes negros e negras de forma que represente a diversidade étnico-racial da sociedade brasileira” em um prazo de dez dias. Se isso não acontecer, pode abrir uma ação contra a Globo.

“O MPT entende que o não espelhamento da sociedade nos programas televisivos gera a perpetuação da exclusão e reafirma estereótipos de limitação de espaços a serem ocupados pela população negra”, diz comunicado.

Bahia - De acordo com artigo do jornal A Verdade, citando dados do IBGE, apenas 17,8% dos negros do Estado são alfabetizados, e os pardos, 17,1%. A Pesquisa de Emprego e Desemprego na Região Metropolitana de Salvador (PED/RMS) de 2011, edição especial sobre raça, mostrou que o negro possui rendimento médio por hora trabalhada de apenas 52,3% do rendimento do ocupado não-negro. Segundo este estudo, as mulheres não-negras recebem cerca de 85,5% dos rendimentos de um homem branco, enquanto as mulheres negras ganham apenas 43,8% disso, ou seja, menos metade do que recebe uma branca.

Dados como esses são imprescindíveis para escapar de dois discursos: aquele que tenta enxergar alguma dignidade no tratamento do negro no Estado da Bahia, e aquele que acusa como racistas as opiniões que tendem a associar a exclusão social com o negro.

A exclusão social acontece primeiramente com um caráter de classe, e, em segundo lugar, em um caráter racista ou sexista. Não deve ser, de forma alguma, nenhum demérito para o negro admitir que as periferias e subúrbios da cidade são ocupados predominantemente por negros, ao contrário dos luxuosos bairros da cidade em que negros são raridade. Essa segregação existe por um processo histórico e se perpetua por incompetência ou falta de vontade das administrações públicas em resolvê-la.

Não é, portanto, nenhum absurdo, apesar de trágico, associar as mais precárias condições de sobrevivência do ser humano com os negros. Mas absurdo total é pensar que a Bahia é um lugar bom para o negro viver.

O mais grave de tudo isso é, sem dúvida, que a raiz de todos os problemas às vezes se camufla e se esconde nos discursos dos movimentos negros. É bem verdade que o racismo existe, mas é bem verdade também que ele interessa muito ao Estado. Como disse o ativista sul-africano Steve Biko (1946-1977), “Racismo e capitalismo são duas faces da mesma moeda”. Interessa porque quanto mais hostis os heterossexuais forem aos homossexuais, os negros aos brancos, as mulheres aos homens, etc., mais divididas estarão as suas lutas, mais distantes estarão de se identificar uns com os outros e com aquilo que são: proletários, cuja bandeira é o que pode os unir para uma luta comum.

Quando não mais houver quem lucre com a desvalorização da imagem do negro para justificar sua exploração com baixíssimos salários; quando não mais houver quem massifique a imagem negra feminina para mercantilizá-la, nem quem reprima suas manifestações culturais e religiosas por não haver mais parâmetro estadunidense ou eurocêntrico que determine o que é esteticamente bonito ou religiosamente bom; só aí o negro será verdadeiramente respeitado.

Com informações da Revista Capricho e do Jornal A Verdade